Então o Coworking continua crescendo. Pelo quinto ano consecutivo, o Censo mostra um crescimento do mercado. Em 2019, foi 25%. Hoje existem 1497 espaços de coworking no Brasil. Em comparação com a média mundial, o crescimento do mercado brasileiro é percentualmente mais agressivo, e estamos evoluindo rápido.

Essa parece uma notícia boa, mas precisa ser analisada com calma. A gente entrou um pouco mais tarde na corrida, por aqui, os primeiros espaços datam de 2010. Então é natural que a taxa de crescimento dos primeiros estudos fosse altamente elevada, na casa dos 100% de um ano para outro.

À medida que o mercado vai amadurecendo, essa taxa tende a se aproximar mais do resto do mundo. Afinal, é mais fácil dobrar de 10 pra 20 do que de 1.000 pra 2.000 né? Mas ainda assim, mesmo com taxas mais realistas, a gente continua crescendo. Em um ano de crise em quase todos os setores no Brasil, um segmento aumentar um quarto do seu tamanho é um feito importante.

Por quê?

Essa é a pergunta que eu mais escuto por aqui. “Por que você acredita que o mercado continua crescendo?” Jornalista adora perguntar isso. Querida imprensa, eu amo conversar com vocês, mas vocês precisam ser mais criativos na pergunta. Eu não sou adivinho, eu não sei por que um mercado inteiro está crescendo. Às vezes mal sei por que a minha empresa está crescendo. Mas vou tentar levantar algumas hipóteses baseado no que observamos enquanto desenvolvemos o Censo.

Como toda hipótese, não existem dados pra sustentar essa afirmação. Ela parte de um sentimento pessoal, já que eu reviso pessoalmente boa parte dos espaços que entram no Censo.

1. Diversificação de players

Aqui não estou falando de coworking segmentado, estou falando de empresas surgindo com força em mercados que não nasceram como espaços de trabalho, mas viram uma boa oportunidade e decidiram testar em 2019. Nós falamos sobre isso recentemente neste artigo.

São Hotéis, cafés, bancos, universidades, e diversos outros tipos de negócio que possuem ativos imobiliários com muito espaço ocioso, e perceberam que podem usar do coworking para movimentar este espaço. Muitas vezes não é a fonte principal de receita deles, mas eles estão atentos a mudança de mentalidade da economia moderna. Ativo ocioso, é prejuízo. Uber e Airbnb nos ensinaram isso nos últimos anos.

E estes players não estão pra brincadeira. Um tempo atrás conversamos com uma rede de hotéis com mais de 100 unidades no Brasil. Eles queriam colocar um coworking dentro de cada unidade. Você pode imaginar o impacto que esse movimento vai trazer para o mercado.

2. O Brasil não é só São Paulo.

Nem só as capitais. Um movimento lindo que vejo nos últimos 2 Censos é a expansão pro interior do país e outras cidades fora da capital. Quando a gente fala de coworking, não podemos esquecer do irmão mais velho, os Business Center. Aqueles prédios enormes, cheios de salinhas individuais, lembra? Então, muitas vezes pra esse tipo de operação uma cidade de 50, 100 mil habitantes não valia a pena. O custo era muito maior que o mercado potencial.

Já o coworking, que pode começar literalmente com uma salinha de 20m2, o cenário é outro. Muitas cidades pequenas ganharam o seu primeiro espaço de coworking em 2019. Algumas, começaram a ver o mercado florescer e receber a segunda, terceira unidade. Às vezes do mesmo operador, às vezes de outro.

Em 2019 encontramos espaços de coworking em 195 municípios diferentes, um crescimento em relação aos 169 do ano anterior.

3. Os próprios Business Center.

No primeiro Censo, realizado lá em 2015, praticamente todos os espaços eram aquele coworking raiz, que nasceu da necessidade pessoal de alguém e evoluiu pra um negócio. Com o tempo, empreendimentos que eram 100% focados em espaço privado viram o surgimento de uma nova oportunidade e precisaram se adaptar. Começaram a investir também em ambientes de coworking dentro do seu empreendimento pra não perder um público importante.

Curioso é que os espaços de coworking fizeram o movimento contrário. Hoje é consenso no mercado que o coworking precisa ter uma parte do seu negócio focado em ambientes privados. Tanto por uma questão de fluxo de caixa, como para comportar a evolução do ciclo natural dos coworkers, que vão crescendo e demandam mais área.

4. A expansão e amadurecimento do mercado nacional.

O Coworking Brasil existe desde 2012. A gente tem espaços que estão na plataforma desde essa época. É maravilhoso ver a evolução dos players nacionais. Aqui, toda vez que alguém manda um e-mail pedindo pra adicionar uma nova unidade a gente comemora junto.

Colecionamos histórias de espaços que começaram em uma salinha pequena e aos poucos, ano após ano, foram evoluindo. Primeiro a sala do lado, depois o andar inteiro, o prédio. Uma hora vem a segunda, terceira, quarta unidade. Nesses 8 anos deu pra ver algumas marcas realmente se destacando e expandindo. Seja no modelo de franquias (que aliás, vejo pouco acontecendo ainda), ou com unidades próprias. Algumas marcas, inclusive, começam a se aventurar além das fronteiras nacionais.

5. O custo Brasil.

Essa é uma opinião muito pessoal, mas eu acredito que o coworking entra como uma luva no Brasil. Talvez isso explique por que mesmo tendo um começo um pouco mais tardio, a gente alcançou o resto do mundo rapidinho. E como tudo em um mercado de 200 milhões de pessoas, devemos atingir um protagonismo importante em pouco tempo.

Ouvi esses dias de um gestor que São Paulo tem mais espaços de coworking que Nova York. Fiquei curioso com a comparação e fui atrás de dados. Como não existe um estudo focado na cidade americana, usei a plataforma coworker.com como referência, e encontrei 264 espaços cadastrados lá. São Paulo possui 388 espaços conhecidos na capital. É claro que são bases de dados diferentes, mas não deixa de ser um número interessante.

O Brasil é uma país lindo, mas também difícil. A gente sabe disso. Aqui a gente sempre se protege primeiro, e confia depois. E isso pode ser bem complicado quando você está tentando alugar um pequeno espaço de trabalho pra você e seu sócio. Comprovar renda, fiador, contrato de 12 meses, multa rescisória, “malandragens” do mercado imobiliário, tudo no Brasil te joga na cara um “desista, volte pra casa”. Quando você oferece uma solução onde a pessoa pode assinar um contrato pela manhã, e já começar a trabalhar pela tarde, com burocracia zero, é amor à primeira vista.

Esse movimento, pra mim, é fundamental pra explicar o crescimento brasileiro. Coworking faz sentido em qualquer lugar, mas aqui, faz mais. Confia em mim, esse movimento está só começando.

6. Por fim, uma aposta: os nômades digitais.

Todo mundo fala deles, todo mundo admira, mas poucos realmente entendem. O mundo não é global como dizem. Eu sei disso, morei em 3 países (5 cidades) diferentes nos últimos 10 anos. Tente explicar em qualquer órgão público que você não possui um endereço de residência e vai ver uma cara de “wtf?” da pessoa do outro lado. Nada no mundo está preparado para alguém que não segue o modelo tradicional. O coworking está.

Pra espaços de coworking não interessa se você vai ficar por um dia ou um ano. Se você mora aqui, ou na Estônia. Pro operador de um coworking o que interessa mesmo é quanto você pode agregar para aquela comunidade. Nos melhores, em termos de cultura e diversidade. Em alguns outros, apenas no financeiro mesmo (todo mundo tem boleto).

Eles ainda são poucos, representam traço na economia. Mas o mundo está mudando. As relações empresa/empregado também. Quem sabe o quão relevante eles podem se tornar em mais dez anos?

Nesse segmento, vejo algumas apostas saindo na frente, principalmente os cafés/hotéis. A verdade é que poucos profissionais freelancers tem o capital necessário pra investir em um coworking fulltime, eles precisam estar em um estágio de carreira bem avançado. Nesse caso, quem não depende diretamente do faturamento do espaço pra fechar as contas no fim do mês, pode oferecer condições mais vantajosas pra um público que hoje ainda tem poucas opções.

Essa é a minha opinião, baseado naquilo que vejo todo ano ao desenvolver o Censo. Mas lembre-se, o Censo é um recorte, um ponto de vista. Não é uma verdade absoluta. A gente se esforça muito pra construir uma base de dados relevante e assertiva, mas no fim, sempre possui um viés. Talvez a gente esteja certo, talvez não. Que venha o Censo 2030 pra gente descobrir 🙂

Grande abraço,
Fernando Aguirre