Cada espaço de trabalho compartilhado é único. A maior parte deles segue um mesmo fluxo de tendências e as semelhanças acabam sim sendo mais frequentes dos que as diferenças. Mas, com esse mercado se consolidando cada vez mais, no Brasil e no mundo, e com as rápidas mudanças que o ramo enfrenta todos os anos, é impossível não olhar para as particularidades dos espaços.

Normalmente abordamos por aqui aspectos mais macro do cenário, mas percebemos que existem algumas situações que exigem um olhar um pouco mais atento. Um espaço muito bem sucedido na capital de São Paulo pode até ser modelo e inspiração para um novo coworking em Santo André, por exemplo, mas é preciso compreender que as cenas são distintas. E é sobre isso que o nosso papo de hoje quer abordar: quais são as principais diferenças entre espaços da capital e do interior?

Ainda é preciso explicar o que é coworking

Quando se começa a pensar em abrir um espaço compartilhado, talvez o futuro founder nem imagine que ele terá um papel muito além do de empreendedor. Não será um negócio como qualquer outro. Quem puxa a frente de um projeto como esse precisa ter em mente que terá, acima de tudo, um papel de educador.

Propagar a cultura do coworking no interior ainda é um desafio a ser superado, coisa que a maioria das capitais, ao menos as maiores, já fez. Desde a barreira com o termo estrangeiro até a quebra de padrões das antigas empresas, há muito trabalho a fazer.

“Iniciar um projeto deste tipo em uma cidade de pequeno porte é desafiador! Primeiro que é uma palavra em inglês: eu falava em ‘coworking’ e as pessoas já me perguntavam ‘co o quê?’, e eu sempre explicava, quantas vezes fosse necessário. Ainda faço isso, diariamente, sempre com muito carinho!”, conta Marina Ortiz, founder do Locomotiva Coworking, em Dourados (MS).

Paciência, persistência e paixão são três das características necessárias nesse estágio inicial do projeto. É preciso acreditar no seu negócio e mostrar para as pessoas o porquê dessa ideia ser interessante e única.

Alugueis mais em conta ainda parecem a melhor solução

Uma das diferenças mais gritantes entre os espaços de capitais e do interior é no preço e nas possibilidades de pacotes. É natural que os valores praticados nas cidades grandes sejam mais altos, afinal, os custos são bem mais elevados.

Essa é uma vantagem para quem pensa em abrir um espaço compartilhado em um município menor. Mas, ao mesmo tempo, alugueis mais em conta podem ser uma tentação para quem ainda está em dúvida se abre um escritório próprio ou se vai para um coworking.

Além disso, fora da capital ainda é um desafio grande mostrar para a população que um coworking vale a pena não só pelo preço. Em lugares com uma mentalidade não tão moderna, é normal que uma nova empresa acredite que conquistar a sede própria seja um sinal de status imponente diante da sociedade.

Público-geral ainda é o foco

Enquanto cidades como São Paulo e Nova York já estão precisando se reinventar e criar espaços mais segmentados, os escritórios do interior ainda estão mirando em um público mais geral.

Esse fato não deve ser considerado um problema, mas sim uma das principais características para se ficar atento na hora de iniciar o negócio. Como atrair diferentes públicos suprindo a necessidade de todos eles e fazendo com que eles se sintam especiais?

Colaboração, inovação e empreendedorismo são as três palavras-chave no Coletivo Coworking.

Aproveite para usar isso a seu favor! Quanto mais variedade de profissionais e empresas trabalhando no seu espaço, mais networking e conexões no dia a dia.

“A maior dificuldade é fazer com que as pessoas consigam entender o real conceito, o porquê compartilhar, e como a pessoa do seu lado, mesmo sendo da mesma profissão, pode ser sua parceira e não um rival comercial”, comenta Willian Teixeira Sormani, founder do Coletivo Coworking, espaço aberto em Araraquara em 2016.

A publicidade boca a boca ainda é a mais importante

Por mais avançados que sejam os estudos sobre publicidade e marketing, não tem jeito, a propaganda boca a boca ainda é a que tem maior peso. Em todos os lugares ela é importante, mas nas cidades menores, justamente pelo fato do coworking ser uma alternativa de trabalho menos conhecida, ela é essencial no processo de propagação do conceito.

Nas capitais e outras cidades grandes, um investimento maior em publicidade pode ser mais relevante, mas no interior a presença diante da comunidade é importantíssima. “O que fizemos foi disseminar a ideia de coworking através de participação em grupos de networking, feiras e visitas em universidades”, contam os sócios e irmãos Wellington de Toledo Garcia e Clayber Walton de Toledo Garcia, fundadores do Workspace, em Pouso Alegre.

Mas, mesmo que o ideal seja gerar publicidade espontânea a partir dos coworkers e outras pessoas familiarizadas com a sua comunidade, é importante manter uma presença virtual muito ativa. Como defende Willian, “divulgação é sempre essencial, presença online nem se fale. O espaço tem que marcar presença diariamente para que as pessoas possam lembrar dele”.

Os espaços são menores, mas também mais acolhedores

É difícil apontar regras quando o assunto é a estrutura dos coworkings. Mas, em geral, os espaços das cidades menores têm um clima mais acolhedor, totalmente propício para que as novas conexões aconteçam. A proximidade dos membros da comunidade é maior, e o papel do founder e do community manager é bem importante para que as trocas aconteçam.

“Quando vou fechar a venda de uma estação de trabalho, por exemplo, as pessoas me conhecem e por isso tenho que oferecer muita flexibilidade, tantos nos preços como no horário de funcionamento do espaço. Como a ideia é a pessoa acreditar no conceito, preciso fazer com que o conceito encaixe na rotina ou no orçamento do profissional. É necessário jogo de cintura para se adaptar à realidade de cada cliente que entra aqui”, explica Marina.

Espaço Workspace fica em Pouso Alegre, interior de Minas Gerais.

É preciso conhecer o seu terreno

Como falamos anteriormente, por mais parecidos que os espaços possam parecer, existem detalhes importantes que fazem com que cada um seja único. Um fator muito importante é a localidade. Ao planejar um novo coworking é preciso compreender qual é o cenário econômico e social da cidade, e como você pode fazer parte disso de forma sustentável. Você precisa estar ciente das dificuldades locais também, pois elas podem influenciar na fluidez do seu negócio.

Um bom exemplo vem dos sócios do Offcina Coworking, que fica em Blumenau, uma cidade que ainda mantém muito forte a cultura alemã. “Realmente não é fácil começar um projeto desse tipo em uma cidade do interior, ainda mais sendo o primeiro espaço desse tipo em toda a região. Além do fato de ser uma cidade pequena, tínhamos outra barreira a quebrar (apesar de acharmos que isso não seria um obstáculo): Blumenau, por ser um município de descendência alemã, sempre foi considerada uma cidade fechada. Ouvimos milhares de vezes as pessoas falarem que nunca ia dar certo aqui uma proposta das pessoas trabalharem juntas, dividindo uma mesa. Achávamos essa ideia sobre a cidade um pouco batida mas, claro, precisávamos fazer algo para que as pessoas entendessem ou ao menos se interessassem pelo assunto”, contam os sócios Ricardo Luiz Guedes, Yuri Alexandre Borges e Alessandro Luciano Salvador.

A forma encontrada para atrair o público para o espaço foi investir em um café próprio. Assim, muita gente passou a conhecer o coworking e o primeiro contato com a cultura passou a acontecer.

Offcina investiu em um café para atrair público.

As tendências de coworking chegam no interior, mas um pouco depois

Na última década, o coworking evoluiu muito e não para nunca de mudar. Como os principais movimentos começaram nos Estados Unidos e na Europa, é por lá que as tendências despertam e depois chegam até os demais continentes. E, obviamente, aqui no Brasil as novidades tendem a surgir primeiro nas capitais e somente depois de um tempo nas cidades menores.

“No interior tudo acontece um pouquinho depois, mas as coisas estão acontecendo sempre, devemos estar atentos a isso. Fiz algumas visitas técnicas em coworkings de São Paulo também para enxergar o negócio em funcionamento e tentar replicar no interior do país”, conta Marina, founder do Locomotiva.

O bacana de ficar atento ao que está rolando pelas cidades maiores é que o founder do interior já consegue ficar preparado para o que vai acontecer em um ou dois anos. Ou seja, o que poderia parecer um atraso é, na verdade, uma preparação mais consciente para o futuro.

“Penso que o importante é não ficar parado. Um ambiente de coworking precisa ser algo ativo, plural e que mude o tempo todo. Tendências nacionais e internacionais se aplicam, sim, desde de que traduzidas para cada espaço”, acrescentam os sócios do Offcina.

O “concorrente” será mais um parceiro do que você imagina

Por aqui nós acreditamos que não existe isso de concorrência quando o assunto é coworking. Inclusive já escrevemos um artigo sobre isso, que você pode conferir aqui. E, quando se trata das cidades do interior, esse pensamento deve ser ainda mais óbvio. Isso porque, quanto mais espaços surgirem, mais fácil ficará de se propagar a cultura dos escritórios compartilhados.

“No interior, o seu ‘concorrente’ é mais parceiro do que nunca, já que é outra empresa te ajudando a ensinar o conceito na cidade. Neste mercado novo é isso que tentamos fazer, seja através das parcerias ou das participações em eventos. O importante é ser visto e conseguir levar o conceito ao maior número de pessoas”, complementa Marina.

No interior, os eventos são peça essencial

E, por último, um ponto importantíssimo para os coworkings de interior é o investimento em eventos. Os cursos e palestras promovidos pelos espaços podem não ser a maior fonte de lucro do negócio, como apontou o Censo 2017, mas são importantes por tudo que movimentam. Segundo o levantamento, apenas 7% do faturamento vem diretamente dos eventos, mas é sempre preciso olhar além e enxergar tudo o que esses encontros representam.

Na Locomotiva, os eventos e integrações são parte essencial da agenda de atividades.

“A promoção de eventos é uma necessidade que todos os coworkings precisam se atentar. É através dos eventos que você pode tanto conseguir um novo cliente como também pode oferecer uma forma de treinamento para os coworkers que ali já estão”, opinam os sócios do Workspace.

Mesmo quando o escritório não participa diretamente da criação e divulgação do evento, e acaba fazendo apenas a parte da locação da estrutura, é o nome do coworking que estará lá diante dos participantes e convidados.

“Eventos são sempre bem vindos para poder mostrar sua estrutura e para que as pessoas circulem pelo espaço, podendo assim se tornar um embaixador do conceito. A comunidade tem que ser alimentada constantemente a fim de mostrar que o que o cliente possui neste espaço ele não encontrará igual em outro”, acrescenta William.

Como você pôde perceber, são vários os detalhes que diferenciam os coworkings do interior e da capital, e cada espaço deve encontrar a direção mais adequada para o seu negócio. Se estiver pensando em abrir um espaço, pesquise muito, converse com outros founders e visite o máximo de coworkings que conseguir.

E se você já tem um espaço fora da capital, conta pra gente nos comentários quais são seus principais desafios no dia a dia. Você acredita que é mais fácil ou mais difícil atuar no interior?