Um dia você é o salvador do bairro, aquele que desbravou uma região não explorada e abriu o primeiro espaço de coworking daquela comunidade. Centenas de curiosos vêm conhecer o seu espaço, ver o que é essa tal de “cowork”. Talvez até alguns veículos de imprensa local entrem em contato e você acabe dando suas primeiras entrevistas.

Seis meses depois tem mais escritórios compartilhados no seu bairro do que restaurantes de sushi e paleta mexicana. É chato, né? Todo o trabalho que você teve para abrir o mercado, educar o público e criar relações com a comunidade de repente não faz a menor diferença. Aí então as pessoas começam a perguntar por que irão assinar um contrato com você se o coworking do outro lado da rua custa apenas a metade do preço.

Bom, eu tenho duas notícias pra você. A ruim é que o modelo de espaços de trabalho compartilhados não para de crescer, ano após ano. Na minha visão de mercado, ele só vai estabilizar quando espaços forem como farmácias: você nunca vai ficar mais do que 15 minutos a pé de um.

A segunda notícia é que ainda falta muito tempo pra isso acontecer e talvez esse crescimento de mercado não seja tão ruim como você pode pensar.

Concorrência existe em absolutamente todo o mercado. Essa é a graça do jogo. Às vezes ela atrapalha, às vezes ela ajuda. Mas o grande barato é que normalmente você pode aprender muito com um vizinho do mesmo ramo, seja com os erros ou com os acertos. Nesse tempo de mercado eu vi alguns cenários bem comuns que preocupam os founders:

1. Meu espaço era o único da cidade e agora tem outros

Esse é o mais comum e o mais tranquilo de lidar. Em 2011 eu abri o primeiro espaço de coworking do Rio Grande Sul, em Porto Alegre. Nós recebemos bastante atenção da mídia gaúcha, saímos em praticamente todos os grandes veículos.

Mas a verdade é que a gente era um espaço de 20 posições, em uma cidade com mais de 1 milhão de habitantes. Mesmo que o local fosse 10 vezes maior, não teríamos capacidade de atender nem mesmo uma fração do público potencial.

Cada pessoa é única e possui necessidades únicas. Nós estávamos em um bairro, com um tipo de ambiente, voltado para um público específico, de uma faixa de valor. Concorrência era uma necessidade, não um problema.

2. Chegou um espaço muito maior na minha região e todos querem ir pra lá

Algum tempo atrás, quando a Cubo abriu suas portas em São Paulo, eu lembro que os grupos de discussão de founders estavam enlouquecidos. Muitos espaços paulistas com medo de perder clientes e alguns efetivamente perdendo. Na época, um prédio de 5 andares de coworking era algo incabível, e muitos achavam que eles iriam engolir os espaços pequenos.

A verdade se mostrou exatamente o contrário, e o número de espaços de coworking em São Paulo cresceu 47% no último ano. Você sabe por quê?

Voltando ao meu exemplo pessoal, mais ou menos 6 meses após eu abrir o meu espaço em Porto Alegre, a Nós Coworking abriu sua primeira unidade alguns quilômetros de distância da gente. Na época, eu senti exatamente o mesmo que o mercado de São Paulo viveu em 2016. Um concorrente 5 vezes maior, com 10 vezes mais capital e 20 vezes mais experiência entrando “na minha cidade”.

Eles eram maiores, mais cool, com mais estrutura, capital e experiência que a gente. Nas primeiras semanas de atividade eles investiram pesado em divulgar o novo espaço. E a verdade é que eles acabaram injetando mais verba de publicidade que todos os outros espaços existentes já haviam feito juntos em 6 meses. E isso foi – surpreendentemente – muito bom para o mercado inteiro.

Ninguém troca trabalhar diariamente com amigos sentados ao lado por um ambiente mais cool.

Eu lembro que naquelas semanas o nosso movimento aumentou significativamente. Muitos e-mails, telefonemas e visitas chegando no nosso espaço. O que acontece é que toda vez que um espaço de coworking faz um grande trabalho de divulgação ele acaba divulgando em primeiro lugar o conceito de coworking. Com isso, o público conhece o modelo e faz as suas próprias pesquisas de mercado no Google, onde ele encontra dezenas de outras opções.

Foi exatamente o mesmo cenário que aconteceu anos depois com a Cubo. Eu sei que ver o seu coworker te trocar pelo espaço novo dói, mas a verdade é que se ele decidiu pela troca é porque você não pôde oferecer algo que a pessoa valorizava. E se você colocar na balança o quanto grandes espaços investem na divulgação do segmento e o quanto eles movimentam as comunidades locais, no longo prazo é vantagem para todo o mercado.

Hoje, quando pergunto para alguém que nunca frequentou um espaço se ele sabe o que é coworking, o que eu escuto é algo como “é tipo a Cubo né? Ou tipo o Google Campus, ou a WeWork?”.

3. Chegou um espaço que está cobrando a metade do preço que meu coworking cobra

Ok, aqui nós temos dois cenários possíveis que precisam ser compreendidos.

Opção 1: este player sabe o que está fazendo, tem um produto de qualidade e está com uma ação promocional agressiva. Aqui, sinto te informar, mas é do jogo. Todo mercado sofre com isso, e é exatamente por esse motivo que você não pode basear o seu negócio em preço. Se o seu único diferencial é o preço, sempre vai ter alguém maior pra competir com você.

Eu falo mais sobre isso nesse artigo aqui, dá uma conferida: Quem vem por preço, por preço vai embora. Quem vem por valor, fica.

Opção 2: o espaço tem metade da sua estrutura, e oferece metade dos seus serviços, com metade da sua qualidade. Nesse caso, o problema não é o concorrente, é o seu público. Talvez a sua faixa de preço não esteja de acordo com o público que suas estratégias de marketing estão conversando.

Não adianta, tem gente que simplesmente está atrás de uma cadeia e internet. Não importa o quanto você se esforce para mostrar como fomenta uma comunidade vibrante, como tem a preocupação em oferecer uma cadeira ergonômica e uma mesa na altura correta. Se o coworker está sem verba e só precisa urgentemente de um espaço para trabalhar, qualquer mesa é uma mesa.

Ergonomia, redundância de internet, limpeza diária, ambiente interessante, organização de eventos relevantes e localização facilitada têm um custo. Alguns estão dispostos a pagar, outros não. Se o seu concorrente consegue oferecer a mesma coisa que você, pela metade do preço, essa conta não fecha. Ou tem algo muito errado na gestão do seu espaço, ou em breve você terá um concorrente a menos.

4. Abriu um espaço igual ao meu, na mesma faixa de preços, e está levando todos os meus coworkers

Hum, agora vem a hora da verdade. No caso do seu concorrente oferecer uma estrutura muito próxima a sua, com localização similar, mesma faixa de preço e ainda assim estar levando seus coworkers, é possível que haja algum incômodo que você não está percebendo, e é muito importante que você descubra logo.

A melhor forma de descobrir é conversar com seus coworkers, inclusive os que estão saindo. Tente entender o motivo. Você pode chamar para uma conversa aqueles coworkers que você tem uma melhor relação, ou fazer algum tipo de pesquisa anônima dentro do seu espaço.

Talvez seja algo bobo, como uma simples decoração mais interessante e renovada. Talvez seja algo um pouco mais complexo, como uma relação difícil com um dos coworkers ou gestores do espaço. Ou talvez seja algo importante mas facilmente gerenciável, como um serviço que você não oferece e que pode agregar.

Seja qual for a questão, o mais importante é você entender que trocar de espaço não é algo trivial. Você irá abandonar a relação com os colegas e ter que iniciar tudo novamente. Se as pessoas estão trocando seu espaço pelo vizinho, você tem um problema que precisa ser resolvido. E esse problema passa longe do fato do vizinho simplesmente existir.

Eu sei que este texto pode parecer muito otimista ao argumentar que toda concorrência é saudável. Existe sim casos de concorrência desleal, e alguns cenários mais complicados. Mas o ponto principal é compreender que, por natureza, mais espaços chegando ao mercado é benéfico pra todo mundo.

Isso significa mais dinheiro sendo investido, mais opções para os diferentes públicos, mais pessoas “não early adopters” conhecendo a cultura e questionando o seu escritório atual.

A verdade é que a grande concorrência do mercado de coworking está longe de ser o coworking vizinho. Ela é o seu vizinho literalmente. As outras salas comerciais do seu prédio. Ou o andar de baixo cheio de escritórios daquela multinacional que ainda não entendeu quanto dinheiro ela joga fora anualmente utilizando espaços assim.

E se você nunca mais quiser perder coworkers para um outro espaço, eu tenho uma última dica pra você: invista o máximo possível em criar bons relacionamentos dentro dos espaços. Ninguém troca trabalhar diariamente com amigos sentados ao lado por um ambiente mais cool ou alguns reais a mais na carteira. 😉

Alguém concorda comigo?

Grande abraço,
Fernando Aguirre

 

Leia também: